quarta-feira, 31 de maio de 2017

Gnose, Neoplatonismo e Maçonaria

Por Arthur Feitosa Vieira Monteiro, 31/05/2017           
Deus Arquiteto do Universo, Bible moralisée, Bíblia francesa da metade do século XIII

INTRODUÇÃO

A maioria das iniciações induz ao iniciando a uma passagem de um mundo mais externo para um mundo mais interno. No caso da maçonaria, o maçom pode ser iniciado do contexto material, desprovido de consciência maçônica para o espiritual para a aquisição de uma consciência maçônica.

Após adentrar aos mistérios da maçonaria, o maçom é apresentado a alguns ensinamentos que ressaltam os males da humanidade que comumente se apresentam como: da hipocrisia, do vício, da perfídia, do erro, do fanatismo, da ambição, da corrupção, da vaidade. Assim, o maçom passa a construir a consciência maçônica, com algumas ferramentas na qual se facilita a conexão com o Ente Supremo com o objetivo de proporcionar a felicidade, que são pontos comuns ao Gnosticismo e Neoplatonismo.

Gnose
Encontramos a definição de Gnose em (BUENO,2007): Gnose é o conhecimento, ciência superior da religião; teologia; doutrina dos gnósticos. Conhecimento das ideias religiosas pela razão.

Os gregos dividiram o conhecimento, em dois ramos principais: Episteme e Gnosis. Episteme passou a ser o designativo do conhecimento de natureza material e gnosis o designativo do conhecimento de natureza espiritual. Gnose é a ciência da sabedoria suprema, com o qual os gnósticos acreditam alcançarão a salvação, é o conhecimento mais intuitivo, não é de forma alguma um conhecimento científico ou racional é a estrada que leva à mística espiritual iluminação, esoterismo.

Gnose pode referir-se a conhecimento ou percepção direta de aspectos ocultos ou esotéricos do cosmos (gnose cosmológica), ou a visão espiritual direta na transcendência (gnose metafísica). A cosmológica é dualista, sutil, de sujeito-objeto, e pertence ao domínio do conhecimento. A metafísica é não dualista e discernimento espiritual...
...O homem é visto como o microcosmo do macrocosmo – o universo divino. Vale dizer que a interpretação do que a Gnose é, atualmente, difere substantivamente daquilo que está apresentado na história do esoterismo ocidental. A gnose identifica-se com as “correspondências”, que são um mundo holístico e interconectado, já que “todos somos um”.  (GUIMARÃES, 2007, p.160-161)

O gnosticismo como doutrina da gnose, surge a partir do século I d.C. e destacam-se Gnosticismo Siríaco-egípcio, persa, medieval, cristão. Atualmente As escolas Gnósticas dividem-se em 3 grupos: o primeiro grupo da escola persa encontra-se o mandeísmo e Maniqueísmo; o segundo grupo da escola sírio-egípcia se apoiavam no monoteísmo; e o terceiro grupo formado por seitas tais como Simão Mago e Marcião de Sinope, Cerinto, Ofitas, Cainitas, Carpocracianos, Borboritas, Paulicianos, Bogomilos, Búlgara e Cátaros, que utilizam o gnosticismo como base miscigenada com influências da época ou região em que atuavam.

O Gnosticismo utiliza termos que são características particulares do Conhecimento Gnósticos, tais como: Arcontes, Æons, Demiurgo, Emanação, Gnose, Mônada, Pleroma, Sofia, dentre outras.

Para a Igreja Católica o Gnosticismo é uma reunião de Igrejas Heréticas, pois acredita-se que é um sistema filosófico influenciada pelas ideias e linguagem cristã. Porém grandes pensadores católicos e padres tais como São Irineu e Clemente de Alexandria falavam muito sobre gnose no sentido do conhecimento de Jesus Cristo por meio da fé. “a verdadeira gnose – escreve Santo Irineu – é a doutrina dos Apóstolos” (ARANDA apud Adversus Haereses,IV, 33).

O gnosticismo foi impulsionado em 1945 com a descoberta da Biblioteca de Nag Gamadi, Contemplam textos gnósticos da época do cristianismo primitivo, compreendem 13 volumes. Os textos foram declarados apócrifos pela atual Igreja Católica.

Destacam-se os gnósticos Raimundo Lulio, Nicolas Flamel, Basilio Valentin, Cornélio Agrippa, Paracelso, Conde de Saint Germain, Cagliostro, Fulcanelli, Helena Blavatsky, Annie Besant, Samael Aun Weor, William Blake, Arthur Schopenhauer, Albert Pike, dentre outros.


Neoplatonismo
O Neoplatonismo foi o período final do platonismo surgiu pelos pensamentos de Plotino, que acreditava que o Mal não existia e sim a ausência do Bem e a contemplação filosófica proporcionava a perfeição e felicidade.

Plotino, descendente de gregos, nascido em Lícope no Alto Egito no ano de 204 d.C. e faleceu em 270 d.C. Discípulo de Amônio Sacas em Alexandria. Na Pérsia estudou filosofia persa e indiana. Foi para Roma e fundou uma escola e permaneceu por 25 anos, teve como discípulos Amélio e Porfírio.

Resumidamente a doutrina fundamenta-se em três hipóstases: o uno, a inteligência e a alma. Conforme (REALI, 2003, p 369):

O princípio do qual derivam todas as coisas é o Uno. E o Uno produz todas as coisas pela sua superabundância. E a superabundância é a sua infinita potências. O Ser é o produto do Uno; e o Ser olhando a si próprio torna-se inteligência (Nous, Espírito). Do Nous procede, ulteriormente, a Alma que, por sua vez, produz a Natureza em suas várias formas.

Porfírio publicou os 54 tratados de Plotino, que foram agrupados na Enéadas com seis grupos de nove tratados. A primeira Enéada trata do homem e da moral; a segunda do mundo e das leis físicas; a terceira do destino e da providência; a quarta trata da alma. A quinta trata da inteligência e a sexta trata do ser e do uno.

O Neoplatonismo influenciou o Misticismo Cristão, Neoplatonismo Islâmico com o texto “Teologia de Aristosteles” e na atualideade o Ocultismo Ocidental com Blatavsky. Segundo (GUIMARÃES, 2007, p.184) a maior das sínteses foi obtida pelo filósofo neoplatônico Pico della Mirandola (31, em 1494) e envolvia Platonismo, Aristotelismo, Estoicismo, pensamento hebreu, misticismo judaico, filosofia árabe e um conjunto de outras ideias que formavam um “sistema de filosofias avulsas”.


Confluências entre o Conhecimento Gnóstico e o Neoplatonismo
O Conhecimento Gnóstico nos seus vários textos é utilizado termos e conceitos filosóficos gregos baseados no platonismo, tais como hipóstase que significa a  realidade, a existência; ousia que significa essência, substância, ser; e demiurgo que significa Deus criador. Ainda Incluem textos como a Hipóstase dos Arcontes que trata da "Realidade dos Governantes" ou Protenoia Trimórfica que trata do "O primeiro pensamento em três formas". Pode-se destacar as correspondências entre Gnose e Neoplatonismo na seguinte tabela:


Neoplatonismo
Gnose
Hipóstases
Æons
Uno
Mônada
Nous
Pleroma
Alma do Mundo
Sophia
Hyle
Sizígia
Tabela 1 – Correspondência entre Gnose e Neoplatonismo

Distinções entre o Conhecimento Gnóstico e o Neoplatonismo
A principal divergência entre o Conhecimento Gnóstico e o Neoplatonismo orbita entre o Tempo e o Mal.

O Tempo, no Neoplatonismo, Plotino defende que a eternidade é a vida do Uno e o tempo associa-se à Alma do mundo. No Gnosticismo não é concebido o tempo do mundo como fundamentado na eternidade inteligível.

O Mal é considerado no gnosticismo como produto do erro. O semideus Abraxas é comparado a um demônio que é responsável por gerar no mundo a verdade e falsidade, bem e mal, luz e sombra. Os Neoplatônicos não acreditavam no Mal e negavam que este pudesse ter uma real existência no mundo, tudo era bom e simplesmente o Mal não existia e sim a “ausência de Bem”.


CONCLUSÃO
O Neoplatonismo e o Gnosticismo são duas correntes de pensamentos filosóficos e esoterismo que caminharam na mesma época, bebendo, além das diversas fontes, na mesma fonte do conhecimento propagado por Platão.

O Neoplatonismo foi a última escola da filosofia pagã, síntese do Estoicismo, Pitagorismo e do Platonismo, sob forte influência do paganismo grego. Tratou de teosofia, filosofia, misticismo e teurgia e influenciou com o passar do tempo os movimentos místicos cristãos, islâmicos, sufismo e cabala judaica.

O Gnosticismo trata a dualidade da natureza humana, e ressalta que o conhecimento é colocado em primeiro lugar para a salvação, descarta a fé como um elemento de passividade. O conhecimento é a mais alta e imensurável riqueza que se pode possuir, porque permite descobrir o maravilhoso tesouro que o homem tem dentro de si mesmo.

Sendo a maçonaria é a maior fraternidade iniciática do mundo e congrega em sua filosofia antiquíssimos símbolos e rituais guardiões de antigos conhecimentos, práticas e costumes que foram preservados e organizados.

Podemos encontrar na maçonaria a aspectos da Gnose e o Neoplatonismo, assim como, outros ensinamentos de escolas filosóficas, esotéricas, místicas da antiguidade. Ao ser iniciado e por consequência dos seus esforços em interpretar, com seu estudo e prática será preparado para construção da consciência espiritual.


REFERÊNCIAS

— ALENCAR, Renato de  - Enciclopédia histórica do mundo maçônico – Tomo II – Rio de Janeiro – Editora Maçônica, 1980.
— ARANDA, Gonzalo – Quem são os gnósticos - Disponível em http://www.opusdei.org.br/pt-br/article/quem-sao-os-gnosticos/ acessado em 29/05/2017.
— BUENO – Silveira Minidicionário da língua portuguesa – 2ª Edição – São Paulo – Editora FTD, 2007.
— GUIMARÃES – João Francisco - História Da Maçonaria Consolidação, Expansão e conflitos Institucionais – Brasília – DF -  UnyLeya, 2016.
— GUIMARÃES – João Francisco Maçonaria: a filosofia do conhecimento – 2ª Ed. – São Paulo – Editora Madras, 2006.
— MOURAVIEFF, Boris – Gnose: estudos esotéricos – São Pauo: Editora Ícone: 1989.
— REALI, Giovani – História da filosofia: filosofia pagã antiga – Plotino e o Neoplatonismo, v.1 – São Paulo: Editora Paulus, 2003.
— STAVISH, Mark – As origens ocultas da maçonaria: Rituais, símbolos e história de uma sociedade secreta – São Paulo – Editora Pensamento, 2011.